Por uma abordagem brasileira para a inovação aberta

Uma coisa que a gente discute muito no Faber-Ludens é que os modelos de gestão e metodologias de design precisam ser adaptados para a realidade da cultura brasileira. O discurso da inovação aberta, crowdsourcing e etc funciona bacana nos EUA, onde existe o tal do Cognitive Surplus que o Shirky fala, mas no Brasil, nós achamos que o viés tem que ser diferente.

O brasileiro tende a ser bastante individualista nas relações de trabalho, em parte devido ao ranço da burocracia estatal, que ainda influencia as empresas. Porém, quando o assunto é festa, o brasileiro é muito colaborativo. É por isso que a gente tenta desenvolver ações de inovação aberta envolvendo a algum tipo de prazer pela interação social.

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No caso do Corais, a gente utiliza alguns elementos que se assemelham a games (ícones, pontuação, ilustrações, colecionar conhecimentos), mas o que realmente empolga os usuários é se sentir parte da co-criação. Gosto bastante do exemplo de como foi desenvolvida a logo para o projeto Vocabulário da Participação.

Eu acho que esse vínculo prático que a gente faz entre design e inovação aberta, dentro da perspectiva cultural brasileira, é bem peculiar. Superficialmente o Corais se parece muito ao Open Ideo e HCD Connect, porém, a gente enfatiza muito mais a interaçõe entre os membros do que com nossa organização.

Eu acho que esse é um ponto crucial: brasileiro não curte botar azeitona na empada das empresas, colaborar com a plataforma de crowdsourcing dela. As iniciativas que estão dando certo no Brasil oferecem algum tipo de retorno financeiro, e isso brasileiro gosta, porém, não acho uma estratégia sustentável, pois não cria vínculos afetivos, sensação de ownership, enfim, relacionamento mais duradouros.

Acaba que inovação aberta se reduz a concursos, uma prática que as empresas já faziam há muito tempo! Não tem nada de inovador nisso...

Comentários

#1

Concordo, a gente tem muitas variáveis para trabalhar no dia a dia. Além da cultura nacional, ampla, temos a cultura das cidades, a cultura das empresas, a cultura dos grupos, todas estas camadas se somando. O que funciona num ambiente nem sempre funciona bem no outro. Sem dúvida é um trabalho criativo escolher as soluções que funcionam em cada um.

#2

Fred, acredito que para a inovação aberta funcionar, devemos buscar o real motivo da falta de colaboração.

Se fosse a cultura estatal, o norte americano não estaria entre os mais competitivos no trabalho ao mesmo tempo entre os que mais se envolvem nos assuntos de sua comunidade, pois são um país de economia e política muito liberal.

Tendo trabalhado metade da minha vida profissional em uma estatal e outra metade na iniciativa privada, posso te afirmar que nas vezes em que algum colega tentou me puxar o tapete ou impedir meu acesso a alguma informação, isso aconteceu na iniciativa privada...

Acredito que se o dinheiro/status deixar de o principal motivo de participação em um projeto aberto, ele vai vingar por causa da disruptura com o modelo de trabalho tradicional.

Daí sim as pessoas vão focar no objetivo principal do projeto: melhorar a vida de todos.

#3


Alexandre, a ruptura com o modelo de trabalho tradicional não é garantia de mudança... 
nem para melhor... nem pior...você pode inclusive mudar e continuar tendo o mesmo resultado.  
Na gestão dos processos temos dois elementos que influenciam profundamente o andamento individual de cada um que compõe a equipe, e estes estão profundamente relacionados (conheço isso pois sou gestora de projetos). São eles os elementos culturais e os comportamentais. Nosso modelo de trabalho foi sim culturalmente herdado de outras nações, porém, naturalmente houveram mudanças, devido ao contexto que muda constantemente, assim como as necessidades dos projetos e das equipes, quando dizemos cultural também devemos lembrar como é nosso modelo cultural familiar, ou de amizades... alguns grupos tendem a ser mais confiantes, outros mais competitivos, outros mais inseguros... tudo tem uma motivação, mas nem sempre é algo percebido.
 
Na questão comportamental temos alguns padrões também... dando um exemplo, pessoas que possuem uma alta carga de responsabilidade no trabalho podem reagir de várias formas dependendo de como ela está  preparada (repertório),... se pegamos um designer, ou mesmo um programador,  que não tem contato algum com o cliente, não tem que dar satisfações a ele, e apenas fazer seu trabalho de forma operacional, e mudamos essa conduta, passamos a colocar ele em contato direto com o cliente, e faze-lo conceituar e defender seu trabalho, a carga de responsabilidade dele aumenta, e ele pode reagir tanto ficando inseguro  produzindo menos, quanto aumentando a produtividade dele se ele encarar aquilo como um desafio e sentir segurança, nesse caso o apoio que o restante da equipe deve dar a ele é muito importante (tanto os chefes, quanto os vários departamentos da empresa, quanto o restante da equipe de produção). ....
E isso é manipulável. Se  isso acontecer com toda a equipe (ou time,como eu gosto de chamar) no segundo formato, a produtividade e envolvimento tende a aumentar de uma forma geral.... dessa forma existe espaço para a inovação acontecer naturalmente, buscando sempre soluções novas para questões antigas. É  mais uma questão de relacionamento inter pessoal, empatia.... é o perceber como o outro é/está e dar apoio a ele e ao crescimento individual de cada um, e estes ao se sentirem confortáveis com a atitude de apoio começam a reproduzir o mesmo.
 
Conseguir envolver o time é realmente trabalhoso. Pensa-se muitas vezes que é uma questão de dinheiro, mas quase ninguém começa a reclamar do trabalho somente com isso, as reclamações sempre vem acompanhadas, a questão de quanto se ganha para fazer algo é só o mais fácil de perceber por ser mais fácil de quantificar ......

Talvez essa discução seja uma oportunidade bacana para fazermos alguns mapeamentos de conduta para gerar essa motivação voltada a inovação aberta nas equipes

;-)

#4

A minha teoria de motivação para participação em comunidades está fundamentada no prazer. Escrevi um artigo há alguns anos sobre Virtualidades Comunais. Se a pessoa sente prazer em participar, ela participa. A partir do momento em que a comunidade lhe traz mais chateação do que prazer, então ela desanima. 

Quando falo de prazer, falo de qualquer tipo de prazer: aprender, conhecer pessoas interessantes, trocar uma idéia, realizar um objetivo, receber reconhecimento, etc. É esse prazer que vai gerar valor para as organizações lá na frente, na forma de trabalho. No capitalismo, os indivíduos são livres e trabalham por prazer. Pode ser o prazer do próprio trabalho ou o prazer do que podem fazer com o salário. 

A inovação aberta, nessa visão, significa encontrar prazer (e valor) fora da organização. Fora das organizações, você não tem mais a percepção de uma comunidade, não se espera reconhecimento ou salário. Por outro lado, existe a possibilidade de conhecer novas pessoas, participar de novos projetos, enfim, de encontrar o outro. 

Se a gente consegue motivar as pessoas a apreciar, se interessar pelo outro, mesmo que esse outro seja um tanto parecido consigo, aí a gente chega na inovação aberta.

Trazendo a discussão para a prática: o que a gente poderia melhorar no Corais para obter mais prazer pela interação social? Minimizar a chateação melhorando a usabilidade não necessariamente promove o prazer. Existem muitos sistemas terríveis em termos de usabilidade mas que dão muito prazer (os sadomasoquistas que o digam!). 

#5

Olha, no caso do Corais melhorar a usabilidade ajudaria.

Vi os posts teu e da Meryenn porque voltei ao site já que o serviços de mensagem do Corais não me avisou das tuas respostas (sei lá porquê!).

Dar significado ao que está sendo feito torna o projeto interessante às pessoas; não seria interessante criar projetos 'isca' que atraiam designers da comunidade para que tenham um primeiro contato com o Corais e depois se tornem eles mesmo os criadores de novos projetos? Apenas algumas divagações...

#6

Alexandre, você não recebeu notificação ainda porque sua configuração de notificações está para envios semanais. Você pode mudar isso para enviar imediatamente em Opções da Conta.

Essa idéia de projetos isca é muito boa, algo como os desafios humanitários que a OpenIdeo propõe. Mas aí vamos precisar de voluntários que se comprometam a não só iniciar o projeto, mas também de participar dele, postando coisas com frequência, enfim, precisamos de animadores de rede. 

Eu diria já tivemos alguns projetos com esse resultado aqui: UXCards, Oca Digital, Vocabulário da Participação. A questão é trazer as pessoas que compreendam o papel de uma ferramenta como o Corais dentro de uma estratégia de inovação aberta. A ferramenta em si não é capaz de fazer nada sem a habilidade humana de articular redes. Como é que a gente pode fortalecer isso? Talvez através de eventos virtuais.